27.3.07

Posso imaginar o teu regresso


Dentro das minhas mãos é, agora, madrugada.
Corto o pulso ao poema. Invento a rima.
Dou à paixão uma forma feminina.
A morna intriga do tempo paira
sobre os meus passos. E contorno,
nos lábios, palavras tão lentas
como veleiros presos ao silêncio.
É pela noite, quando as madressilvas
adejam, perfumadas, sobre emboscados
silêncios, que posso imaginar o teu regresso.
Trarás contigo o ritual do prazer,
exilado nos teus passos.
Já te aceno deste longe, ou deste sonho,
com o mesmo lenço branco do passado.
Não tragas sombras, te direi, enquanto procuro,
nos teus olhos, a lembrança de dias festivos.
Talvez uma súplica.
Talvez um aviso.
Talvez, tão só, um desejo
de luz ancorado em meu olhar.


Graça Pires
De Uma certa forma de errância, 2003

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