16.9.11

Ortografia do olhar

Salvador Dali

Os barcos aproximam-se do quotidiano,
pelos atalhos da luz, no corpo da tarde.
Ao mesmo tempo, de cidade em cidade,
uma inquietante treva incendeia, noite adentro,
o ruído mitológico das maresias de outono.
Um navegante sem bússola

enforca-se no cais dos percursos para sul,
como se rastejasse a paisagem dos sonhos,
pelo lado mais escarpado da alma.
Ritual de sangue inadiável.
Rotas afogadas nas pálpebras.
Quilha de silêncio onde ficamos exilados e cúmplices,
reassumindo não sei que espanto,
enconchando o coração para nele caber
o estremecimento intacto de um rio.
A brisa, de feição, justificará o lentíssimo
tumulto dos remos junto à foz.


Graça Pires
De Ortografia do olhar, 1996

Minhas Amigas e meus Amigos, faz hoje 5 anos que iniciei o meu blogue "Ortografia do olhar" exactamente assim: com esta imagem e este poema. Fiz muitas amizades e a todos agradeço o carinho que me demonstraram.
Não vou fechar o blogue. Continuarei a publicar os poemas, mas por falta de tempo fecharei a caixa de comentários, pois não acho justo não poder responder às vossas agradáveis mensagens. Espero que continuem a ser meus leitores e meus amigos. Se eu puder ser útil a alguém o meu endereço electrónico é o seguinte:
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