27.5.12

Tão verdes as mãos com que agarrávamos o tempo

Ana Pires

Os rituais da infância não nos deixam esquecer:
Era verde a sombra das árvores no pátio da escola.
Eram verdes os trigais pejados de papoilas.
Eram verdes os pássaros que traziam um prado
colado ao voo rasante, nas tardes de verão.
E os rios tão verdes. Tão verdes as águas.
Tão verdes os peixes. Tão verdes os barcos invisíveis.
Tão verdes as mãos com que agarrávamos o tempo.

Graça Pires
De Uma vara de medir o sol, 2012

16.5.12

CONVITE

11.5.12

Do meu país vos digo



Do meu país vos digo:
Dos aromas de urze e alfazema.
Dos caminhos de rosmaninho e alecrim.
Dos matizes, no verão,
rasando a terra sem sombra
e demandando os rituais
das uvas pisadas no lagar,
ou em bocas abertas à dádiva da colheita.
Do intenso tom de júbilo
que retorna em cada primavera
com a insondável melodia
dos jacarandás rondando as ruas
pela cercadura sombria dos arbustos.

Graça Pires
De A incidência da luz, 2011

5.5.12

Onde estás, Mãe?

Vieira da Silva

Defino geometrias na memória,
para reconstruir a casa onde nasci
e, apenas, a lenta urgência dos teus passos
ecoa dentro de mim, mãe.
O teu sorriso podia ser, agora, o prelúdio
de todas as sinfonias.
Adormeço no teu colo,
enquanto  as nuvens
se penduram nos meus punhos
e o anúncio de um grande amor
se insinua sobre a minha cabeça,
como um vórtice que me arrasta
para o centro de um maternal labirinto.


Graça Pires
De Conjugar afectos, 1997