27.8.07

Em seara alheia


Vou-me embora pra Pasárgada

Vou-me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada

Vou-me embora pra Pasárgada
Aqui eu não sou feliz
Lá a existência é uma aventura
De tal modo inconsenquente
Que Joana a Louca de Espanha
Rainha e falsa demente
Vem a ser contraparente
Da nora que nunca tive

E como farei ginástica
Andarei de bicicleta
Montarei em burro brabo
Subirei no pau-de-sebo
Tomarei banhos de mar!
E quando estiver cansado
Deito na beira do rio
Mando chamar a mãe-d’água
Pra me contar as histórias
Que no tempo de eu menino
Rosa vinha me contar
Vou-me embora pra Pasárgada

Em Pasárgada tem tudo
É outra civilização
Tem um processo seguro
De impedir a concepção
Tem telefone automático
Tem alcalóide à vontade
Tem prostitutas bonitas
Para a gente namorar

E quando eu estiver mais triste
Mas triste de não ter jeito
Quando de noite me der
Vontade de me matar
– Lá sou amigo do rei –
Terei a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada.

Manuel Bandeira
in Poesia Completa e Prosa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1990

8 comentários:

hfm disse...

Um dos mais belos poemas!

Unknown disse...

Tive uma disciplina na faculdade de literatura africana e brasileira e li pela pela 1.ª vez Manuel Bandeira. Gostei.

Isamar disse...

Vim ao encontro da poesia e por aqui fiquei a degustá-la.Um poema de que gosto muito. Do poema e de Manuel Bandeira.Sublimes!
Beijinhos

Manuel Veiga disse...

boa estada minha amiga. nesse mítico lugar de "Pasárgada"...

abraço

Luis Eme disse...

Esse lugar, Pássargada, deve ser um espanto...

Menina Marota disse...

Um dos poemas mais místicos de Manuel Bandeira...um Poeta de eleição...

Espero que voltes depressa ;)))

Beijo e continuação de boa semana ;)

Graça Pires disse...

Obrigada pela visita Helena.

Carreira, o Manuel Bandeira é um poeta brasileiro de referência. Obrigada e volta sempre.

Sophiamar, obrigada por vires ao encontro da poesia.

Herético, é bom termos uma Pasárgada para fazermos uma fuga de vez em quando.

Luis é como dizes.

Obrigada Menina. Estou de volta. Pasárgada fica onde quisermos.

Um beijo a todos.

Anónimo disse...

Estou sempre por aqui, e nunca comentei, por vezes a poesia deve ser contemplada no silêncio, mas adoro seu espaço, o dom da palavra está por todo lado, simplesmente perfeito.

Manuel Bandeira e sua mágica poesia.
Esse ano tivemos algumas republicações dele aqui no Brasil, para alegria das letras claro, em um dos livros, vem um cd com 29 poemas na voz do próprio Bandeira, inclusive esse do post.
Bom achei que poderia gostar:

http://www.box.net/shared/zbk9hiv80p

Abraços.