Amedeo Modigliani
Nesta
manhã em que as premonições
pulsam
a bússola dos sentidos
vou
usando aquele modo inútil
de
morder as palavras até ao amargor.
Não
amassei o pão. Não lavei a roupa.
Tenho
os pés inchados e a cor do asfalto
trespassada
no olhar.
O
corpo agitado acima da desordem
tornou-me
fugitiva, clandestina,
a
versão disfarçada do meu nome.
Exercito
argumentos na ferrugem
da
descrença e deixo que o desvario
de
pretéritas dores refaça os sonhos
que
em nenhuma fala se pronunciam.
Finco
o cotovelo sobre a mesa
e
resvala-me o pensamento
para
um tempo anterior à solidão.
Já
não me inquietam os pequenos
detalhes
com que se pode enlouquecer.
Graça Pires
De Fui quase todas as mulheres de Modigliani, 2017, p. 11