1.9.10

À procura das fontes


Manuel Fazenda Lourenço



Ela abria as mãos sobre as pedras e ouvia
o som da água na margem das encostas.
Conhecia o voo dos pássaros aninhados
na trepadeira da latada e o reflexo da luz
escondida na chuva das manhãs.
Lavrara o campo, eito a eito,
com o corpo aguçado de paixão.
Um dia, ao acordar, sentiu que as nascentes
lhe mirravam no rosto.
Por toda a parte as fendas da sede sulcavam o chão.
Nunca mais foi vista.
Enlouquecida anda de terra em terra
à procura das fontes,
com um punhado de lama enrolado em cada pulso.


Graça Pires
De Saudade: revista de poesia, nº 12, Jun 2010. Organ. de Amadeu Baptista

40 comentários:

© Piedade Araújo Sol (Pity) disse...

sempre a qualidade inegavel de como se faz poesia.

gostei muito, tanto do poema como da foto que o acompanha.

um beij

Ana Oliveira disse...

Trágico e belo...

É quando sabemos que nos enlouquece a espera sem esperança.

Obrigada

Um beijo

Pena disse...

Admirável Poetiza Amiga:
Um delicioso poema que nos remete para as gentes sofridas de origem campestre.
Com beleza e gigantesco sentir, o seu!
Já me tinha lembrado de si?
Cria "explosões" de poesia fascinante a quem passa aqui. E, isso, é bem maravilhoso e bem merecido para si.
MUITO OBRIGADO pela linda visita.
Adorei a sua poesia que nos traz hoje, pelo hino rural pertinente digno de emoção e sentimento.
Parabéns.
Abraço amigo de parabéns.
Com respeito.
Sempre a admirá-la e ao que confecciona com carinho e dedicação sublimes e perfeitas.

pena

Adorei.
Bem-Haja, poetiza de sonho.

Wilson Torres Nanini disse...

Grça,

esse trecho "Enlouquecida anda de terra em terra à procura das fontes,
com um punhado de lama enrolado em cada pulso." reforça toda urgência do poeta para extrair do branco papel o poema. Sempre perambulamos à espreita.

Foi uma de suas melhores postagens: imagem e poema se completam.

Abraços!

São disse...

A secura é uma lepra destrutiva e dura.

Beijinhos.

hfm disse...

E não será essa loucura a melhor das fontes?

Braulio Pereira disse...

fontes de prazer..

em noite escura

agua quero beber...

sacia minha secura


adoro teus poemas tuas paalavras..

me enobreces


beijos!!

~*Rebeca*~ disse...

A fonte pode até secar, mas a busca irriga o caminho.

até mais.

Jota Cê

Licínia Quitério disse...

Quando as fontes em nós se secam, podem dizer-nos loucos.

LINDO!!

Beijo, Graça.

De Amor e de Terra disse...

Que coisa tão nostalgicamente bela, Graça; Obrigada!
É sempre um momento muito especial visitá-la. É de fontes como esta que gosto de beber.

Bjs.
M.M.

dade amorim disse...

O retrato fiel da beleza pungente do desespero. Belíssimo poema, Graça.

Beijo grande.

manuela baptista disse...

Graça

eu sei

porque é que ela nunca mais foi vista!

a sede é profunda
depois de tanta água

e enfeito os meus pulsos com pulseiras de terra sulcada

e continuo à procura das fontes

um beijo

Manuela

Marta Vinhais disse...

Sem que saiba exactamente o que se procura....
Lindo....
Obrigada pela visita
Beijos e abraços
Marta

Virgínia do Carmo disse...

À procura de fontes, porque o mundo, por vezes, deixa de bastar...

Um abraço

livia soares disse...

Belo poema.
Faz a gente lembrar que, de certo modo, também andamos assim... com uma sede indefinida, em busca de não sei quais fontes...
ah, você sempre me transporta em seus versos; que hei-de fazer?
Um abraço.

José Manuel Vilhena disse...

Tempo de recolher?
:)

Carlos Teixeira Luis disse...

Um poema muito bonito e não me importo da simplicidade desta expressão porque este é um poema bonito...

Beijo Graça.

Nilson Barcelli disse...

Excelente.
Não tenho mais palavras.
Creio que não me engano se disser que fazes a melhor poesia que conheço na blogosfera.
Um beijo, querida amiga.

Manuel Veiga disse...

anda de terra em terra, sorvendo os ventos e lavrando a sede. da terra...

em sua loucura lúcida...

belíssimo.

beijos

© Maria Manuel disse...

já tinha saudades de te ler, mas espero agora passar mais vezes. encontro este poema lindíssimo, porque sempre são lindos os teus poemas ainda que digam da dor ou da loucura de quem perde de repente o objecto da sua vida; além de, mais uma vez, revelares a tua sensibilidade face a realidades sociais e, neste caso, de gente do meio rural.
um beijo grande.

Desnuda disse...

Graça,

é de uma riqueza este texto! Impecável. Obrigada.

Carinhoso beijo, poeta.

AC disse...

O despertar doloroso para a efemeridade das coisas...
Por aqui a poesia é sempre autêntica!

Beijo :)

teresa p. disse...

Este poema é uma belíssima metáfora que nos alerta para o risco que a terra corre de secar, porque a água é um bem escasso...
A foto ilustra muito bem este grave problema.
Gostei muito!
Beijo.

Úrsula Avner disse...

Belo texto poético num encantador lirismo... Bj com carinho Graça.

Aníbal Duarte Raposo disse...

Graça,

Este poema é lindo. Revejo parte da minha vida na sua leitura.

Beijos

Sonhadora (Rosa Maria) disse...

Minha querida
um belo momento de inspirada poesia...tocante.
Adorei.

Beijinhos com carinho
Sonhadora

Parapeito disse...

Sempre bom beber as suas palavras...
Quem sabe...se na procura das fontes...encontra a nascente...que bom que era...
brisas doces************

avlisjota disse...

Uma excelente imagem repleta de movimento, luz, cor e som. Uma lucidez primaveril das fontes que, tragicamente secam enlouquecendo os olhos impotente da demora...

Por vezes procura-se fora o que está dentro de nós!...

Bjs Graça, e parabéns pela excelência!

José

Unknown disse...

É um poema maravilhoso, acompanhado de uma fotografia soberba. Não digo mais nada para não estragar tanta beleza. Beijinho grande.

Fernando Campanella disse...

A loucura é secura de nossas fontes, a ausência de nossas referências com o estado natural de nossos instintos e emoções. Às vezes nos sentimos assim, sem parâmetros. E vagamos como a enlouquecida do poema. E a poesia, a arte, benditas, nos reabrem as portas de percepção mais profunda, e retomamos o diálogo interrompido de nós para conosco, de nossos eus.
Um beijo, minha amiga.

Gabriela Rocha Martins disse...

terminadas as férias ,e o tempo de "jibóiar" ,retomo a leitura diária dos blogues do meu contentamento .nem sempre comento ( como sabes ) mas todos os dias retenho algo novo ....

...e ,mais uma vez ,sem engano ,fico presa à leitura deste excelente poema




.
um beijo

José Ángel García Caballero disse...

toda viagem procura uma fonte, talvez não por causa da sede, senão pelo precisar de claridade...
belo poema,

um beijo

tecas disse...

Os meus parabéns pelo poema e imagem. Excelente. Triste e belo!
Bjito amigo

Adriana Riess Karnal disse...

Graça,
ela espelha a lama, a loucura q nos incomoda.bj

Luis Eme disse...

o som de água nas margens,

as pedras com palavras...

e ela, sempre inspirada.

abraço Graça

Nilson Barcelli disse...

Vim à procura de novas fontes...
Querida amiga, saio daqui cheio de sede... mirrado... da tua poesia...
Um beijo meu em cada pulso teu (apeteceu-me brincar com as tuas palavras...).

Marcelo Novaes disse...

Graça,


Pungente retrato falado da Nômade que mal sente o chão que pisa.






Um beijo.

José Renato disse...

Os sons, as luzes e o mundo
Paixões da mente e do corpo
Um dia os olhos secam
O coração vira mosaico
A loucura da sede e da fome se dá
E a memória na pele nos avança

me identifico muito com o que escreve

Laura Ferreira disse...

Belíssimas palavras!

maré disse...

quando o vermelho das papoilas irradia luz
e do agreste chão suge, súbita, a garganta gretada da sede, enlouquece-se. com gritos de fêmea enrolados no pulso.

_____ que belo poema, querida Graça.
beijos