25.5.20

Em seara alheia


30.

Não tens outro destino que não o mar 

da lusitana terra portuguesa 
teu berço de sangue e tua onda 
azul de espuma à tua mesa. 
Não tens outro remo outro navio 
outro porto outra casa outra corrente 
que a raiz de avós e o sangue antigo 
a correr-te na veia efervescente. 
Não tens outra manhã aberta sobre o peito 
quando a semente é veramente mater 
quando o céu cobre o ardor do corpo 
e as mãos afagam o pulsar do coração. 
Não tens outro destino, não, 
que o mar é uma canção de moinhos sobre as dunas 
afagando a água onde regressas.

Isabel Fidalgo
In: Sou viagem. Braga: Poética Edições, 2020, p.40

16.5.20

Um homem morreu sem ver o mar

Anne-Sophie Gilloen



Um homem morreu sem ver o mar.
Agora na sua aldeia
os barcos sobrevoam as casas.
Os meninos vestem-se de marinheiros
à espera que qualquer barco
encalhe à sua porta.

Graça Pires
De A solidão é como o vento, 2020, p. 37

7.5.20

Para aminha filha Ana

Elaborado pelo meu irmão José Pires

2.5.20

De cabeça baixa

Monia Merlo


De cabeça baixa, carregada de nevoeiro
como árvores no rigor do frio, ela ouvia
os sinos ao longe e recordava
aquela dor antiga, a mesma que sentira
na hora desalentada da morte da mãe.
Desde então as violetas brancas
emurchecem sempre que as amanha
com as mãos trementes e geladas.

Graça Pires
De A solidão é como o vento, 2020, p. 34