29.11.20

Novo Livro de Poesia


 

Notícia da Editora Labirinto:

Poesia
Título: JOGO SENSUAL NO CHÃO DO PEITO
Autor: Graça Pires
Prefácio: Eugénia Vasques
Capa: Daniel Gonçalves, sob foto de Maycon Marmo
N.° de páginas: 62
ISBN:978-989-54902-7-1
Garanta o seu exemplar em pré-venda (10€), na nossa loja on-line e receba comodamente em casa sem custos.

https://www.editoralabirinto.net/product-page/jogo-sensual-no-ch%C3%A3o-do-peito

Sobre o livro:
 
Quem conhece o que escrevo sabe como gosto de encenar vozes de personagens, imaginando o que elas teriam dito se eu as pudesse ouvir. Por isso tento habitar o enredo que elaboro, para dele me tornar a protagonista.
Porque as pessoas não são apenas o que foram, mas também o que podemos supor que seriam.
É como se as fizéssemos nascer de novo para cumprirem uma viagem através das palavras.
É o poder da inscrição da voz sobre o silêncio.
É a fala da ficção dentro do poema.
É ser, ao mesmo tempo, pensamento e imagem.
Escolhi, Isadora, a bailarina que encantou e chocou o mundo, porque reconheço nela a artista que soube recuperar a inocência através da dança que lhe saía do corpo com uma perturbante plenitude.
Como escreveu Maria Zambrano, para a poesia nada vence a morte, a não ser por momentos, o amor. E foi com amor que incorporei a intimidade de uma mulher que desafiou um a um todos os instantes da sua vida, atravessada por tantos sonhos, tantos êxitos, tantas decepções, sempre de forma fascinante e sedutora.

Graça Pires, Novembro 2020

Se alguém quiser, pode ouvir um poema do novo livro:

https://youtu.be/bXRCgYDb7bg

23.11.20

Apetecia-lhe chorar

Francesca Woodman

Apetecia-lhe chorar
Gritar palavras sem nexo 
até enrouquecer. 
À distância da raiva, 
era visível ainda, a porta 
que ele usara para ir embora. 
Assim. Como quem levanta a bandeira 
do luto na fronteira do olhar. 
Era, agora, interminável o vazio a resvalar 
pelos tabiques, pelos móveis, pelo corpo. 
Tinha insónias. 
E, na língua, cicatrizes profundas 
de tanto soletrar o nome dele. 
O som da sua voz como um chicote.

Graça Pires
De A solidão é como o vento, 2020, p. 29

16.11.20

A redenção de um abraço

Montserrat Gudiol

Para todas as pessoas que estão a sofrer e para todos aqueles que mitigam esse sofrimento

Um cheiro insólito espalha-se pelo mundo
como uma labareda ou uma intriga.
Receamos a rotação dos dias
com sua foice negra.
Cada minuto pode ser um golpe a ferir 
a flor do peito na respiração das manhãs.
De mãos lavadas acenamos de longe
àqueles que, perto do coração, nos acenam.
O céu parece abater-se  sobre a esperança
que renasce a cada hora
mesmo quando o poder das sombras 
nos sobressalta.
Queremos o alento da vida.
Sem luto. Sem iniquidade.
Na frágil redenção de um abraço.

Graça Pires, Nov. 2020

9.11.20

Amava a montanha desde que nasceu

Ansel Adams

Amava a montanha desde que nasceu. 
Amava-a tanto como se fora outra mãe 
que o protegia. 
Um dia em que dilatou o olhar para ocidente, 
entendeu com inexplicável rigor 
um motivo de evasão. 
E quando a neve 
era ainda mais branca nos seus olhos, 
seguiu o chamamento do mar 
na sede das raízes que o prendiam 
ao lugar que amava. 
Agora as gaivotas vêm morder-lhe na boca 
os frutos silvestres.

Graça Pires
De A solidão é como o vento, 2020, p. 27

2.11.20

Deambulou ao acaso

Olívia Marques

Deambulou ao acaso
soltando os fantasmas e os sonhos. 
Transpôs os espelhos quebrados, 
os muros caídos, as árvores já velhas. 
No desfile mágico dos mortos 
procurava pedro páramo, afirmava. 
Mas os caminhos extenuaram-lhe os pés 
e a sua boca inchou com o silêncio, 
com a poeira, com as ervas secas. 
Assombrado, rebolou o corpo 
pelo chão até ser trevo rasteiro.

Graça Pires
De A solidão é como o vento, 2020, p. 53