17.7.23

O tempo que passa

 

Nikolay Tikhomirov


E, no entanto, muda a direcção dos ventos. 
As mãos rondam os gestos. 
A lisura das horas segue o rumo de chronos. 
Um descuido na confluência de ruas
sem retorno arde sob os pés. 
São lugares improváveis onde se chega sem guia, 
só pela ocasionalidade de tudo, só pelo cheiro, 
só pelas lajes com arestas arredondadas. 
Um laço de ferro vem ancorar no peito as marcas 
que alarmam o tempo que passa, 
registado por relógios sem ponteiros, 
a alagar de suor hábitos antigos, 
como uma cilada ou um cutelo 
fendendo os dias tão breves. 
Com minhas mãos povoadas de acenos, 
toco a face intocável das memórias. 
E escrevo. Escrevo a síntese de íntimos silêncios 
para que não se banalize a minha voz diferida. 

Graça Pires 
De Antígona passou por aqui. 2012, p. 33

49 comentários:

" R y k @ r d o " disse...

Poema deslumbrante que me fascinou ler
.
Saudações cordiais. Uma semana feliz
.

Jaime Portela disse...

O tempo é implacável. Não se desvia um milímetro que seja...
Um poema sublime, nada banal.
Boa semana, cara amiga Graça.
Um abraço.

chica disse...

O tempo passa e que bom termos tantas lembranças guardadas e tu as escreve magnificamente !
beijos, ótima semana,chica

Marta Vinhais disse...

O tempo escreve-nos as memórias...Nada podemos esconder...
Beijos e abraços
Marta

Anónimo disse...

O tempo passa rápido e as memórias ficam. Tomara que sejam boas.
Amei o poema!
Uma abraço querida amiga e boa semana!

Roselia Bezerra disse...

Bom dia de paz, querida amiga Graça!
"Com minhas mãos povoadas de acenos,
toco a face intocável das memórias.
E escrevo."
Com as mãos e coração cheios... se escreve poemas densos e relevantes como são todos os seus.
Tenha novos dias abençoados!
Beijinhos



Ailime disse...

Boa tarde Graça,
Um poema muito belo e profundo do seu livro Antígona passou por aqui, em que a Poeta escreve com mestria os sentimentos que a avassalam na passagem do tempo que, implacável, quase não deixa rasto. Ficam as palavras no registo dos silêncios para que perdurem.
Beijinhos minha Amiga e Enorme Poeta.
Desejo-lhe uma boa semana.
Ailime

Luís Palma Gomes disse...

Olá, Graça

O primeiro verso marca a centelha poética. Este é sempre um golpe na inércia, bem representado por "E, no entanto, muda a direcção dos ventos. " O advérbio "no entanto" não é o elemento de somenos. Cria no leitor uma nova dimensão que está antes do poema. Neste caso de estabilidade anterior que se altera, quando nasce o poema. Este verso é aquilo que em literatura se chama "Media Res", ou seja, a "meio da coisa". E garante profundidade pretérita mesmo que apenas pressuposta.

O poema prossegue como uma caminhada por " lugares improváveis", em "confluência de ruas sem retorno" onde ardem os pés, marcando aqui o ritmo do destino, o seu processo irreversível, o jogo da vida. Mas, entretanto, o corpo faz pesado e o caminho difícil, onde se lê "Um laço de ferro vem ancorar no peito (...) um cutelo
fendendo os dias tão breves".

Assim sendo, o final propõe a esperança de quem escreve poesia: fugir de qualquer jeito à banalidade da sua voz lida sempre em diferido.

Beijinhos e boa semana,
Luís

orvalhos poesia disse...

É fantástica sua Poesia, a grandiosidade que vem das suas palavras intensas e tão belas faz-me sempre reler e no meu pensamento, um hino de admiração, assim é uma sorte poder lê-la, obrigada.

Boa semana
Beijinho

Anete disse...

O tempo passa, dispara... O seu poema falou encantadoramente sobre o valor do desfrute, sem largar a essencialidade dos momentos.
Bjs

Mário Margaride disse...

O tempo é sem duvida implacável. Não dá tréguas, não espera por nós. E , foge qual lebre, por entre os dedos das nossas mãos.
Excelente poema, amiga Graça! Gostei imenso.
Votos de uma excelente semana, com muita saúde e paz.
Beijinhos, com carinho e amizade.

Mário Margaride

http://poesiaaquiesta.blogspot.com

brancas nuvens negras disse...

Fazemos frente ao tempo, escrevendo. Não o venceremos mas deixaremos a nossa bandeira no campo de batalha.
Um abraço.

Ana Bailune disse...

Cada verso, uma construção artística. Fico com "Com minhas mãos povoadas de acenos." Que imagem linda e forte!
Adorei.
Abraços.

carlos perrotti disse...

El tiempo, una de mis obsesiones, en sus manos y profuna mirada de Poeta con mayúsculas, aparece aquí redimensionado de una muy original manera. Felicitaciones!!

Abrazo admirado, amiga Graça.

Cidália Ferreira disse...

Fabuloso poema, como já nos habituou! Parabéns!
.
É preciso acreditar...
.
Beijos, e uma ótima semana!

Edite Lima disse...

Tempo que voa , tempo que passa. Escorrega pelos dedos como a areia na ampulheta . Deve ser muito bem aproveitado . e quando se escreve versos lindos como os seus , temos o tempo concretizados em palavras guardadas. Abraços .

Toninho disse...

Quão bom seria ter o controle do tempo nobre poetisa.
Mas ele vem como um cutelo impiedoso.
E como muda o que pensamos no passar do tempo, os sonhos que viram realidade.
Uma beleza elegante de poetizar é sua marca que aplaudo.
Beijo e paz amiga na feliz semana.

lis disse...

É que bom que escreves, Graça
Toda a poesia um cântico ao tempo, esse senhor dos relógios
e dono dos destinos que segue acelerado ou metodicamente,da forma como o sentimos.
Sempre me encantando com seu dom bonito com essa mágica que é ao poder da palavra.
Abraços, amiga e boa noite ,boa seemana.

Sains Box disse...

Faça uma visita a este belo blog.
saudações da Indonésia
sigo seu blog

Um poema muito bonito cheio de profundo significado

baili disse...

in the universe where everything seems so connected to each other Time stands like a biggest mystery indeed

puzzled by it's riddles and restless by it's hands we are in running like mouse in a wheel .

no matter how deeper mark we try to make here which can show how hard we tried ,all we can do is to leave "footprints" behind merely
i wonder if they matter for other mouse trapped in wheel and force to run

let's have faith and hope dear Grace !
hugs and best wishes for your health and precious loved ones!

ManuelFL disse...

«Com minhas mãos povoadas de acenos,
toco a face intocável das memórias.»

Com a sensibilidade e emotividade a que a nossa poeta nos habituou, magnífico poema sobre «o tempo, esse grande escultor», invocando Marguerite Yourcenar.
Beijinhos

bea disse...

Eu queria saber escrever por dentro dessa "síntese de íntimos silêncios" que a poesia da Graça capta de forma inefável. Mas a poesia tem reino só seu. Felizmente a Graça permite-nos vislumbres.
Boa semana, Poeta.
Um abraço

São disse...

Realmente, Kronos é implacável...Valha-nos Kairos!

Gostei muito do poema.

Amiga, beijinho de boa semana com saúde e alegria :)

Laura. M disse...

Precioso canto le haces a este tiempo que nos pasa cada vez más rápido y nos llena de recuerdos.
Buena semana Graça.
Un abrazo.

© Piedade Araújo Sol (Pity) disse...

Graça

o tempo passa, mas as suas palavras ficam e a sua delicadeza e mestria com que faz o poema, fascina quem a lê.

belo poema, assim como a foto que está em complet sintonia.

boa semana com muita saúde.
um beijo
:)

Os olhares da Gracinha! disse...

... o tempo não deixa esquecer um belo poema!👏😘

Manuel Luis disse...

Li também os comentários. Enquanto lia parece que estava a caminhar como faço habitualmente.
Obrigado pela visita. Bjs saude.

Tais Luso de Carvalho disse...

"Com minhas mãos povoadas de acenos,
toco a face intocável das memórias.
E escrevo. Escrevo a síntese de íntimos silêncios
para que não se banalize a minha voz diferida."

Que belíssimo poema, minha amiga, só posso dizer que
cada poema da amiga Graça que leio, saio mais rica, e
sempre sensibilizada.
Uma feliz semana, querida Graça,
beijinho.
Parabéns!

solfirmino disse...

Ontem eu ia escrever outro comentário aqui sobre esse poema maravilhoso, cheio de ótimas imagens para falar. Porém eu ia falar de Chronos, relógios sem ponteiros...
Hoje eu li uma postagem da mãe do meu sobrinho-neto, que vai fazer 5 anos em breve. E ela teve uma menina também, que está com 8 meses. Quando tocamos a face das memórias, acessamos lembranças pessoais profundas, revivemos perdas, como está no poema "com minhas mãos povoadas de acenos", então hoje eu só acrescento que nossas mãos também estão povoadas de saudações e acolhimentos durante nossas vidas.
Um beijinho, querida amiga

Olinda Melo disse...

Quando podemos contar as nossas memórias
é sinal de que conseguimos ultrapassar a
passagem inexorável das horas, mesmo que
o vento siga direcções impensáveis.

Nelas, as memórias, há esse sabor agridoce
que povoa a vida, feito de momentos que
agradam ao coração e outros que mais valia
esquecer. Mas voltam sempre. E os acenos
que tanto podem ser de boas vindas como
de despedida, deixam em nós a sua marca.

Sempre a admirá-la, querida Graça.
Beijinhos
Olinda

Lucinalva disse...

Bom dia, Graça
Lindo poema, o tempo passa rápido, que possamos aproveitar o máximo, um forte abraço.

A.S. disse...

O Chronos da vida é inexorável. Grava cada momento com exatidão, depura todas as circunstâncias e as deixa para sempre num interminável aceno.
Assim, lembramos a vida nessas nítidas imagens nos impressivos momentos que sobreviveram a tudo o mais que se apagou.
Mas nesse vazio depurado há uma longa rede de sinais onde está a razão do que somos hoje.

Muito belo o seu poema minha Amiga Graça.
Uma boa semana com muita saúde.
Beijo.

teresa p. disse...

O tempo que passa rápido, que nos arrasta para rumos diversos e improváveis, que transforma a nossa vida e a nossa alma.
"Com as minhas mãos povoadas de acenos, toco a face intocável das memórias. Escrevo, escrevo a síntese de íntimos silêncios..." Poema magnífico que nos propõe uma reflexão interior. Gostei muito.
Beijo.

Contratar a Piñon Fijo disse...

Eu vejo o futuro repetir o passado
Eu vejo um museu de grandes novidades
O tempo não para
Não para, não para

alberto bertow marabello disse...

Il tempo passa e a volte lascia frutti. I ricordi sono un dono prezioso da scrivere nel cuore.
Molto intensa la tua poesia, amica Poetisa.
Un abbraccio

Maria Rodrigues disse...

O tempo passa inexoravelmente e vai deixando marcas e memórias.
Um poema sublime.
Beijinhos

Mário Margaride disse...

Olá, amiga Graça,
passando por aqui, relendo este belo poema que muito gostei, e desejar um feliz fim de semana, com muita saúde e paz.
Beijinhos , com carinho e amizade.

Mário Margaride

http://poesiaaquiesta.blogspot.com

Teresa Almeida disse...

Nada em ti é banal, minha amiga.
Já te falei do prazer que tenho em ler-te.

Um beijo, como tu te despedes e eu gosto.

Sinval Santos da Silveira disse...

Escritora/ Poetisa, Graça Pires !
A sutileza da narração, marca a exuberância
do texto poéico.
Que obra primorosa,amiga! Parabéns!
Um feliz final de semana, e um fraternal
abraço, aqui do Brasil !
Sinval.

Fá menor disse...

Muito bela conjugação de palavras! Como sempre.
Ainda que a direcção do vente mude, que nunca se banalize a voz, embora os ecos possam ser mais, ou menos, perceptíveis!

Beijinhos.

Mirtes Stolze. disse...

Boa tarde Graça
Lindo poema, o tempo muito importante. Feliz fds. Beijos.

Isa Sá disse...

Bonito poema.
Isabel Sá
Brilhos da Moda

baili disse...

time is mystery indeed dear Grace even if it is formed by the curvature in the fabric of space the impact it has on our life and memories specially is magical .

i truly enjoyed how you mentioned time here ,absolutely "spell casting" poem i am still in awe :)

health ,peace and pleasure !

partilha de silêncios disse...

Um poema muito belo.
Uma boa semana
bjs

Patrícia Pinna disse...

Boa noite, Graça. És uma poeta muito sensível e inteligente.Li e reli o seu poema de tão belo e profundo. Escrever silêncios se faz necessário, pois é o momento mais íntimo que temos.
Parabéns. Excelente semana de paz e luz.
Beijos na alma.

AC disse...

Entro no blogue, leio, volto a ler. E, de tal forma o poema impressiona que, de repente, surge a inspiração para um texto, embora ele não esteja à altura, não me custa reconhecer, daquilo que o motivou.
Grato, Graça.

Um beijinho :)

Carlos Augusto Pereyra Martínez disse...

El tiempo nos marca la vida, o como en el poema la tajadea, es herida del momento que se enjuga, beso que se recuerda, tantas cosas que nos habla de haber sido y ser. Un abrazo. Carlos

Ana Freire disse...

Um poema muito belo e introspectivo sobre a passagem do tempo!
Adorei cada palavra!
Um beijinho!
Ana

Ana Freire disse...

Maravilhoso e absolutamente tocante, este poema!
Grata por mais uma magistral partilha, Graça!
Um beijinho
Ana