13.10.08

Alguns apontamentos

Paul Strand


Antes que a memória me apanhe desprevenida,
tomo alguns apontamentos de lavoura:
os cestos de vime escondem os sobressaltos
do vento de outono, no meio do azinho
cortado no verão;
os sulcos de trigo inquietam-se
com as chuvas estivais, quando os guizos
das cabras soam de nordeste;
um temporal pode explodir no bico dos melros,
se o tempo das cerejas sair do calendário,
ou o sol não brilhar no mês de março;
na próxima floração acenderemos o forno
e o pão que comermos será caseiro.


Graça Pires
De Quando as estevas entraram no poema, 2005

40 comentários:

Paula Raposo disse...

Sublimes estes apontamentos!! Beijos.

Teresa Durães disse...

apontamentos da natureza

hfm disse...

E porque me terá feito pensar em Torga... da terra, da profunda lucidez.

d'Angelo Rodrigues disse...

Há sobressaltos do encanto que soa de norte a sul, de leste a oeste, na sua palavra. Sempre parece ser tempo de poesia no seu calendário, Graça, não importa o tom do estio, pois versos inquietos de beleza brilham como sol nas suas mãos.

JPD disse...

Extraordinaria exaltação da vida fora das grandes cidades.

Excelente, Graça.

(Apenas duas notas:
1ª O nosso quotidiano está cheio de memorias e esquecimentos para que as emoções ocorram;
2ª A nota de ideia de felicidade de Savater «A felicidade como anseio...» é sublime)

(É bom aceder a comentários que acrescentam valor.)
Bjs

LM,paris disse...

Querida Graça,
que lindo, envolvem-me as suas palavras e alarga-se-me o peito!!!
Lindo, cheio de emoçao pura.
Vi tudo e aqueçi os dedos na lareira e partilho agora o pao consigo.
Merci pour Hatsué.
Paris vous embrasse!
Eu também,
Bjos,
LM

Van disse...

Graça....
Já te disse hoje que sou tua fã?
Pois é.... Sou sua fã!

E que o tempo das cerejas NUNCA acabe!
Beijucas querida

isabel mendes ferreira disse...

o teu olhar tem com toda a certeza uma memória especial.!!!!!


um "cesto" que recolho. e aonde me "escondo".


G.


(como é bom vir aqui....)

obrigada.


beijooooo.

Cöllybry disse...

Preciosos apontamentos para quando a memora nos falha...

Beijito


olharIndiscreto

Anónimo disse...

"na próxima floração
acenderemos o forno
e o pão que comeremos
será caseiro"
Apontamento muito importante... Será que me poderás convidar para esse banquete?
Beijo.

maré disse...

a memória rebenta-nos tantos temporais...


na fonética

com que
nos
e os escutamos...

_______

essas são para guardar sim, num cesto, junto do sol.

bjs Graça

Anónimo disse...

O máximo!gostava que fosse a:arte-e-ponto.blogspot.com

Carlos Ramos disse...

E apontas bem, com toda a pontaria...
Bj.

vieira calado disse...

Que bom! Pão caseiro!
Hoje é tudo à inglesa, Nem côdea tem...
Bjs

Anónimo disse...

um poema com o sabor a lembranças de rugas dum sol tardio...

Elizabeth F. de Oliveira disse...

Tão poeticamente bucólico, Graça!
Sempre fico tão 'sobressaltada' com as imagens que crias.
beijo grande

partilha de silêncios disse...

Senti esse cheiro a vime e a azinho seco... sentei-me à lareira... fechei os olhos, ouvi o soprar do vento e os guizos das cabras ao longe... adormeci e acordei com o cheiro a pão quente a saír do forno.

Obrigada, pela mensagem de esperança
bjs

AnaMar (pseudónimo) disse...

Momentos de ternura campestre.
Como me transportam às memórias da minha infância.

O aroma do pão acabado de cozer...

A fruta colhida das árvores e comida sem se lavar :-D

As vindimas...

as desfolhadas...

Sim, excelentes apontamentos.
Beijo de agradecimento.

Celina Rodrigues disse...

Desculpe a ousadia mas são apontamentos tão meus. Ainda hoje comi pão caseiro amassado pelas mãos da minha querida mãe.

Unknown disse...

que poema tão comestível e bem cheiroso!
Lindo.
Telúrico, rural, fisiológico.
A alma, contente.
Beijo.
EA

Cláudia Silva e Cunha disse...

E que bem que se lê os teus "apontamentos"!
Gostei mto!

Luis Eme disse...

que bons e frescos apontamentos, Graça...

abraço

Rui Caetano disse...

Muito bonito, profundo e leve ao mesmo tempo.

Manuel Veiga disse...

que belo odor a pão cozido. amassado pelas próprias mãos.

adorei. pelo teu talento. pela beleza dopoema.

... e pelas minha memórias.

beijo

Victor Oliveira Mateus disse...

... e subitamente apeteceu-me sair
da cidade, voltar a essa infância
que, construída, nunca existiu de
facto...
Um beijo, Graça.

Ailime disse...

Uma ode perfeita aos aromas e sabores com que a natureza nos presenteia, fazendo-me regressar aos tempos da minha infância!
Maravilhoso: "um temporal pode explodir no bico dos melros,
se o tempo das cerejas sair do calendário"!
Parabéns pela sua constante inspiração!
Beijo terno.

Bandida disse...

absolutamente fantástico!!


parabéns a quem tão bem escreve!


e um beijo

luis lourenço disse...

a beleza dos gestos simples...leve pq inteiramente poético...

abraços

Licínia Quitério disse...

Muito, muito belo!

Um beijo.

Nilson Barcelli disse...

Fabuloso cara amiga. Mais uma vez, parabéns pela tua criatividade.
Só podes ter nascido e criada no campo... quem nasce na cidade não é crível que escreva com tanta riqueza de imagens (há quem não saiba, por exemplo, que os melros gostam de cerejas ou de que quadrante vem a chuva...).
Para além disso és boa observadora...
Beijinhos.

Anónimo disse...

Que texto maravilhoso, Graça!!!
Palavras que me aconchegaram
Emocionei-me...
Beijinho

hfm disse...

Na Linha de Cabotagem há algo para si.

Nina Owls disse...

vim pelo link de já nem sei quem.
Gostei tanto de ler isto que me sentei apenas a reler de cafe na mão e um sentimento de cumplicidade. Aqui não há guizos de cabras, apenas o seu balir bem perto a chamar-me. E o tempo das cerejas não pode faltar nunca.
Fez-me sonhar. E apresentou-me um belo quadro rústico. ;)
Creio que este link está disponivel no vida de vidro. Vou confirmar.

isabel mendes ferreira disse...

aponto o meu beijp. calado.


grato.



muito.



_________________.

Maria Carvalhosa disse...

Está espectacular, querida Graça!
A ideia... o desenvolvimento da mesma, com a desenvoltura de palavras que tu usas para exprimir tudo o que sentes!
Beijos ternos, amiga.

Anónimo disse...

Gosto do Outono, centra-me em memórias e ritos ancestrais que muito estimo. Encontro os ecos disso no poema. "Antes que a memória nos apanhe desprevenidos", façamos crónica!
Um prazer ler este poema, Graça.
Um beijo

batista disse...

dizes de coisas que me são mui queridas. quantas vezes passeei por essas tuas palavras? muitas: e em todas elas me deliciei. grato.

deixo um abraço fraterno.

Menina Marota disse...

Reter na memória e no pensamento...
épocas transmutadas... que só em letras, quem sabe, no futuro sentiremos...

Beijo

© Maria Manuel disse...

como fazes do Outono um poema!

Parapeito disse...

...que belas palavras...enchem o ar...
Que bom é o cheirino do pão quente:))