30.10.08

Quem me disse?

Marco Somoni

Encostada às paredes interditas do futuro,
vou desenhando as memórias do caos
em que me escrevo, neste cansaço de pedra.
Como um exorcismo inadiável, tudo
o que aceitei sem reservas percorreu
a cor evasiva dos contrastes
que, nos meus joelhos descuidados,
linearmente se desfizeram.
A caminho de todas as fragilidades,
os fantasmas do amor acotovelam-se
na minha voz, condenados a um sonho
mudo, gravando no silêncio o eco
dos abraços que não deram.
E vêm todos calados, como se a morte
das palavras tivesse acontecido.
Quem me disse que nunca tinha fim
o tempo dos desejos?

Graça Pires
De Outono: lugar fágil, 1993

42 comentários:

batista disse...

na dureza da pedra uma pergunta. na dureza da pedra, palavras, urdidas no silêncio... e gritadas no coração da pedra. bate um coração no peito da pedra. bate um coração no peito da pedra que dorme no colo da terra... e é de lá que escorrem as tuas inquietações, traduzidas em palavras.

deixo um abraço fraterno, leve, leve... como uma pedra, quicando na superfície da água.

Paula Raposo disse...

E nunca tem fim...belíssimo poema, Graça!! Gosto muito. Beijos.

isabel mendes ferreira disse...

oh Graça....


_____________.


disse-te um deus especial....nessa voz antiga que te vem do fundo dos dias...


_____________como me sinto aqui em


casa....


abraço-te.

hfm disse...

Não tem não, Graça, ele há é dias... abençoados para que tenhamos poemas deste calibre. Um beijo.

maré disse...

como ilhas, vamos acumulando abraços adiados.

ninguém nos diz das areias do lado do coração
.
.
.
um deserto progressivo.

_______

Profunda mente...

um beijo, Graça

maré

Mésmero disse...

Até onde sabemos, a morte acaba com todos os desejos. Mas, enquanto isso, na terra dos vivos...

DE-PROPOSITO disse...

o tempo dos desejos?
---------------
E porque não 'o templo dos desejos?' .
Os desejos são como os sonhos; uns tornam-se realidades, outros não passam disso; de desejos ou de sonhos.
Fica bem.
E a felicidade por aí.
Manuel

Anónimo disse...

talvez o próprio desejo,

que permanece na essência das palavras.

Unknown disse...

Falo, num poema meu, no interstício das pedras, rumo às fontes do desejo. E lendo o teu, acho que os desejos se escondem nas pedras e nunca morrem. Por isso é aí, nas pedras, que eles, os desejos, como fantasmas, nos atormentam. Mas vamos sempre ao templo ouvir o que das pedras, como oráculos, se desprende.
Beijo para ti e para o poema.
EA

São disse...

Fantasmas mudos e tristes são os que povoam as noites de insónia e solidão...
Bem hajas!

Luis Eme disse...

quem te disse, disse bem...

o tempo dos desejos nunca tem fim, mesmo os pequeninos...

abraço Graça

Mié disse...

vim pela mão de um piano


e fico...abismada
sinto-me nas tuas palavras

A vêm todos calados...

Quem me disse que nunca tinha fim o tempo dos desejos?
...

cansaço de pedra.

Vim para ficar.

um beijo

enorme

Obrigada por este momento.

Mar Arável disse...

Nunca é tarde para

amar uma pedra

Anónimo disse...

Lindo!... Extraordinariamente Lindo.

ivone disse...

um fim sem ser visto . efémero esse tempo. deseja_se assim por vezes. outras não. tem fim sim. o desejo do tempo.

L.N. disse...

"A caminho de todas as fragilidades,
os fantasmas do amor acotovelam-se
na minha voz"

só por isto fiquei despido e não tive frio, há coisas que ardem à flor da pele e nos deixam plantados ao solo.

Um abraço Graça.

(num estes dias irei colocar um dos seus poemas no lugares mal situados).

Teresa Durães disse...

esses sonhos perdidos

Anónimo disse...

A vida em toda a sua intensidade...
Poema lindíssimo que cai fundo cá dentro.
Beijo.

AnaMar (pseudónimo) disse...

O próprio tempo nos diz que não tem fim o tempo dos desejos.

O mesmo tempo que por vezes foge e não nos dá tempo para os realizarmos.

Bj

dona tela disse...

Olhe, desta vez deu-nos para sonhar...

Muito obrigada por todas as atenções.

Regina Graça disse...

Depois dos desejo talvez possa vir a serenidade, e com ela, a plenitude...

Bjinho

maria disse...

Quem não deseja ler-te quando lê estas palavras?
Beijo

© Piedade Araújo Sol (Pity) disse...

quem disse..disse bem.

os desejos nunca teem fim mesmo.

gostei de ler.
beij

Maria Carvalhosa disse...

"Quem me disse que nunca tinha fim
o tempo dos desejos?" Sim. Quem?
Obrigada, Graça. Também já está no outro canal... (risos).
Beijinhos, amiga.

Luna disse...

As paredes do futuro por vezes são tao densas
beijos

d'Angelo Rodrigues disse...

O tempo que por vezes emudece sonhos com indagações traz preciosidades como "Quem me disse?". Fica a minha pergunta, Graça: sabia que tamanha beleza pode machucar?

Ailime disse...

Um poema muito belo e profundo.
Um grito às fragilidades, com que a vida nos vai “mimando”.
Um grito à realidade que aos poucos se apodera de nós,
quase sem darmos por isso!
"Quem me disse que nunca tinha fim o tempo dos desejos?", Sim, quem disse?
Um beijo.

Elizabeth F. de Oliveira disse...

Enquanto vivermos, os desejos permanecem intactos, como se os anos sobre eles não pesassem.
Lindo!!!!

Isamar disse...

O tempo dos desejos não tem fim.Felizmente para nós que assim acontece. Uns dias menos bons, outros menos maus mas os desejos vão acontecendo.

Mil beijinhos

Victor Oliveira Mateus disse...

Li o poema várias vezes, minha amiga e continuo sem me decidir:
nostalgia ou serenidade? Quer seja uma ou outra deu lugar a uma pérola.
Um beijo, Graça.

Joana Roque Lino disse...

Graça,

O nome do teu blogue dava um excelente título para um livro. E a tua alma é, definitivamente, poeta. Um beijinho e bom fim de semana.

livia soares disse...

Querida Graça,
eis um belo poema - mais um - para a gente fruir e refletir.
Um abraço.

morenocris disse...

Oi. Coloquei o seu link no crisblogando.blogspot. A conheci através do diversos-afins. Parabéns. Gostei muito de suas peças e de seu blog. De vez em quando levarei algumas para o blog. Tenho três: morenocris.blogspot - crisblogando.blogspot - umapaixaoamazonica.blogspot

http://cinzasdecarvalho.zip.net disse...

Belas imagens, querida Graça: "as paredes interditas do futuro", aquelas que nos impedem de conhecer o que virá. O "cansaço de pedra", com a bela foto ilustrativa (uma forma de corpo humano de pedra deitado ao chão), gerado pelas memórias do caos. Memórias que se expressam pela escrita escorreita. "Linearmente se desfazer" parece estar ligado a coisas caras que se deitavam ao colo e os "joelhos descuidados" deixaram cair, como que "escorrer por entre os dedos". "Os fantasmas do amor" calados como "se a morte das palavras tivesse acontecido". Está brincando? Ainda bem que "como se tivesse", porque suas palavras não morreram, estão bem vivas aí e esteticamente perfeitas. Sabe por quê? Porque alguns fantasmas que se realizaram, desprenderam-se do sonho mudo e dos ecos dos abraços quando os deram.
Se tivesse fim o tempo dos desejos, não brotariam da pedra tanta beleza poética!
Inebriante poema, como sempre!
Obrigada.
Bárbara Carvalho.

José Ángel García Caballero disse...

gravar ecos no silêncio, talvez seja isso a essência do desejo, uma ação sem fim...
Belo poema

luis lourenço disse...

"Quem me disse que nunca tinha fim o tempo dos desejos?"

Uma catarse poética bela e pura com emoções profundas que a tornam autêntica...

abraços

O Profeta disse...

A Lua sangra no celeste
Aprisionada está a razão
Olhos sem a virtude da luz
Uma fria pedra no coração

Um banco de jardim
É leito do rei da sarjeta
Almofada de encardido cartão
Acomoda esta carcaça inquieta



Bom domingo



Mágico beijo

Manuel Veiga disse...

inventamos as palavras até ao fim dos desejos. isso eu sei... e sei que tu sabes! como o poema afirma. com pudor...

belíssimo.

beijos

O Puma disse...

Com palavras belas

também se resiste

De Amor e de Terra disse...

Quem disse isso, não mentiu!
Desejar não tem idade, tal como amar e outros sentimentos mais...

Beijo

Maria Mamede

© Maria Manuel disse...

num momento de maior dureza ou fragilidade, o caos evoca esse fim, mas quem sabem, não é assim? quem sabe os desejos não têm fim?
no entanto, como escreve escreves bem eses momemento de caos, de interrogações,...

Parapeito disse...

...Belo :)
E que nunca tenham fim...

***