31.5.09

Outras crianças

Claude Simon

Começa na rua o seu desamparado destino.
Têm, na certidão de idade,
os anos mais convenientes,
para quem as inicia na droga,
na oficina, na prostituição.
Sem histórias de encantar na hora do sono,
brincam ao acaso, indefesas,
orfãs que são de afectos verdadeiros.
Lutam pela sobrevivência
com a mesma habilidade com que manejam
o canivete, a bola, a rixa, o berlinde.
Cómodo se torna acreditar
que, as suas vozes infantis,
fazem delas crianças iguais às outras.


Graça Pires
De Ortografia do olhar, 1996

54 comentários:

Paula Raposo disse...

Sem dúvida. Cómodo pensar que se nasce igual! Muitos beijos, gostei de te ler.

De Amor e de Terra disse...

Hoje como ontem, (talvez mais que ontem) uns, são mais iguais que outros...
Como diz o povo:-"é a vida!"


Beijo

Maria Mamede

Unknown disse...

Graça,

o seu poema remeteu-me para um trecho de Jorge Amado, com o qual iniciei um texto que escrevi há pouco tempo...


"Vestidos de farrapos sujos, semi-esfomeados, agressivos, soltando palavróes e fumando pontas de cigarro, eram, em verdade, os donos da cidade, os que a conheciam totalmente, os que totalmente a amavam, os seus poetas." (Jorge Amado, Capitães de areia, p. 34)


...mas a sociedade encarrega-se de as ver Outras...

Obrigada por este Olhar Graça,

Um grande abraço, Gisela

Amélia disse...

Bela esta ortografia do olhar pr4esente no poema...Neijo amigo

Pena disse...

Amiga:
Uma realidade vivida daquelas pobres crianças iguais entre si, somente, diferindo no viver corrompido e gasto pela insensatez, quem sabe, dos adultos...?
Um belo poema que descreve, com sensatez e sobriedade: com PUREZA, o seu viver que revolta toda a gente de bem que a falta de bom-senso e iniquidade de gente oculta, as explora, violenta e maltrata sem pudor ou vergonha. Tristes de espírito, sabe? Quem as faz sofrer sem se poderem defender, sabe?
Adorei ler pela relevância de quem sofre...
Beijinhos

pena

Posso contar com o seu voto para o Concurso TOPBLOG? É só clicar na imagem do topo do meu blog, inserir o e-mail e o seu nome e confirmar no seu E-mail. Simples.
Desculpe-me.

© Piedade Araújo Sol (Pity) disse...

como já nos habituou, mais um belo poema, retratando uma realidade, triste e cruel.

li e fico sempre com um nó na garganta quando se trata de crianças.

beij

José Manuel Vilhena disse...

E pouco mudou...infelizmente!

um beijinho

Renata de Aragão Lopes disse...

Poema-retrato...
de uma triste realidade.
Belo texto!

Luis Eme disse...

sem dúvida, Graça, ou os homens de amanhã...

abraço

Roseli Oliveira disse...

E saber que esta realidade é passado distante e presente! E saber que "enquanto os homens exercem seus podres poderes" elas vivem assim sem muita perspectivas de mudanças ... triste!

Abraços!

maré disse...

Ninguém lhes ampara o destino...
Eis como se entra no mundo
já desprovido de sonhos, já de afectos remendados.

Assertivo e tragicamente belo

___
e mais outro beijo
imensíssimo Graça

São disse...

Parabéns! Gostei de saber que estamos em sintonia.
Boa semana.

Béa Pedrosa disse...

crianças que queriam ser apenas crianças.

muito bom voltar no seu blog. ele é fonte de inspiração e olhares por outros ângulos.

um beijo!

teresa p. disse...

Um poema muito forte que faz pensar...
"Outras crianças", as sem infância... uma triste realidade, indigna do ser humano.
Gostei muito.
Beijo.

Teresa Durães disse...

as oportunidades cedo perdidas e as condições de vida que não deixam atingir outras realidades

VFS disse...

como seria o mundo se em vez da igualdade, o verdadeiro credo fosse a equidade.

um beijo

LM,paris disse...

Sao essas vozes que nos lembram o primeiro momento onde também, um dia em crianças, acordàmos a essa injustiça.Os meninos pobres que vinham à escola e que nao tinham caderno, nem sapatos.
é um peso que nos enche de ira,
lindo poema que nos revolta
que ainda hoje seja assim.
Beijos,
merci,
LM

Hercília Fernandes disse...

Minha querida, Amiga.

Belíssimo poema-social você nos traz. Parabéns pelos valores e responsabilidade social expressos.

É preciso que desmistifiquemos as nossas visões sobre a criança/infância. A criança é um ser no tempo e no espaço, portanto real. Absorve, participa das normas, valores, condições de vida da existência. Alguns desses valores são de morte, porém intensamente reais. Por isso é necessário que rompamos com a romantização da infância, já que a criança não é um ser abstrato, possui qualidades relacionadas a sua cultura e historicidade.

Um grande texto, sem perder de vista a poética.

Beijos, Graça!
H.F.

José Ángel García Caballero disse...

brincam ao acaso... talvez ou oxalá for assim a vida toda...
beijos

susana disse...

E hoje dia 1 de junho é dia da criança...:))

Beijo de um anjo

Mofina disse...

As nossas crianças...

tchi disse...

Ermos de berço.

vieira calado disse...

E a verdade é que não fazem!

Nem crianças... nem adultos.


Beijoca

tecas disse...

Um olhar de dentro para fora, da realidade de uma desigualdade injusta no nascer, viver e direitos. Obrigada querida Graça, pelo seu belo poema.Se continuarmos a pensar que sempre será assim, o mundo dessas crianças não muda porque...se fecham os olhos.
Um bem haja e um grande abraço

AnaMar (pseudónimo) disse...

Belo momento de sensibilidade e sensibilização...
Mas a resposta está em nós, na mudança que pretendemos!
Bjs

Celina Rodrigues disse...

Iguais às outras na inocência quebrada pelos sonhos desfeitos.

Déia disse...

Imagine, ter os mesmos desejo que nós, afeto,conforto,calor, amor, tv, videogame...
então arruma seu papelão, se cobre com jornal e tenta continuar a sonhar...

A.S. disse...

Graça...

Infelizmente a igualdade é já uma utopia!...
Há muito que desacreditei... mas ainda sigo o caminho do meu sonho!!!


Um abraço!

mariab disse...

diferentes porque não têm (nunca terão?) as mesmas oportunidades. mesmo que o riso seja igual.
beijos

Anónimo disse...

Não sei como cheguei aqui mas cheguei e gostei :)

Outras crianças mas sempre crinças... e é triste a vida que os abraçou!

Voltarei se não se importar...
Um bejinho

Pena disse...

Um poema incisivo na significação magistral...Soberbo...sublime...
Em prole da salvaguarda do precioso mundo juvenil e infantil.
Delicados. Que a afronta "arrasa" com sonhos belos destes pequeninos sensíveis...extraordinários...ao acaso na luta pela vida...
A sua "arte" porque, isto é "arte" em poesia que é, maravilhosa...
Já não tenho mais palavras...


Uma brilhante poetisa viva que faz poesia da "vida"...

Beijinhos de amizade, muito respeito e deslumbre...
Silenciado...perante a sua "Arte"...

pena

Bem-Haja, genial Amiga Enorme!

Licínia Quitério disse...

E assim continua a ser. Os órfãos de amor que enxameiam cidades e que são (deviam ser) o nosso remorso colectivo.

Beijinho, Graça.

Fá menor disse...

Umas crianças são mais iguais que outras... de algumas querem, por força, fazer delas adultos em miniatura, quando devem ser crianças apenas crianças... e brincar.

Beijinhos

© Maria Manuel disse...

Poema intenso que nos traz motivos reais de reflexão!

beijo, Graça.

O Profeta disse...

Mil caminhos
Esta viagem sem velas nem vento
Este barco na bolina das ondas
Esta chuva miúda transborda sentimento

Amarras prendem o gesto
Arrocham um coração que bate incerto
Uma gaivota retoca as penas com espuma
Levanta voo em rumo concreto

Partilha comigo “100 Anos de Ilusão”


Mágico beijo

Ana Oliveira disse...

Ha verdades que nao mudam nunca...infelizmente!

E as vozes das criancas, na distancia da indiferenca, parecem todas iguais, e os gritos de alegria, dor ou raiva soam, a quem nao quer ouvir, do mesmo modo.

Obrigada por esta chamada de atencao para a dolorosa realidade.

Um beijo

Ana

Nilson Barcelli disse...

E já escrevias tão bem há 13 anos.
Gostei muito, como é óbvio.

Querida amiga, um abraço.

O Puma disse...

Somos diferentes

contra todos os destinos

Ailime disse...

Um poema que espelha bem o viver dramático de muitas crianças que de idênticas a outras só mesmo a sonoridade das suas vozes!
Como neste momento se torna difícil transformar esta situação!
Grata pelo seu poema que lhes é dedicado desta forma tão sublime!
Beijinhos

Tétis disse...

Graça

Como sempre mais um belo poema. Triste mas real, a realidade dura e crua que temos.

Estas "outras crianças" são o espelho da nossa sociedade actual, da que criámos, que alimentamos e que fazemos questão em ignorar que assim seja.

Como muito bem dizes: "Cómodo se torna acreditar..."

Parabéns, amiga e obrigada por mais este contributo para denunciar, para desmascarar a hipocrisia que grassa à nossa volta.

Beijos amigos

luis lourenço disse...

Viva Graça!

tocante...este olhar poético, mas tão realista sobre a vida de tantas crianças...Bem-haja.

beijinho,

Véu de Maya

pin gente disse...

para quem o dicionário do amor é incompleto...
gosto muito
beijos
luísa

Anónimo disse...

um dos nos piores defeitos é sermos comodistas... bem visto, graça. um grande beijinho para si.

dade amorim disse...

Uma realidade trágica, que gostaríamos de modificar mas que persiste pelo tempo. As crianças deviam ser sagradas, mas não é isso que o mundo pensa. Beijo, Graça, e parabéns por seus textos.

isabel mendes ferreira disse...

incómoda a escrita que assim levanta do chão a "cartografia do olhar!".






todo o meu abraço. sempre e sempre.

Laura Ferreira disse...

Inquieta-me o que está para além das palavras...

Tania Anjos disse...

Excelênte, Graça!

Aqui no Brasil, estamos estarrecidos com um vídeo que denuncia um homem "brincando" com uma criança.

Ela, a criança, com uma arma de brinquedo na mão, intimida um certo alguém - imaginário - a devolver-lhe a sua boneca.

Quem propõe as falas é o adulto. A criança apenas repete...

E é o que , de fato, fazem. São produto de uma sociedade doente que as ensinam o que é errado muito cedo.

Uma pena...

Abraços,
Taninha

adouro-te disse...

O que terá mudado nestes meninos desde 1996?
Bjs

Benó disse...

Gostei muito de ler esta homenagem à criança.
Um abraço, Graça.

disse...

Gostei!!!
Boa semana!

Maria Clarinda disse...

Maravilha!!!!Adorei!
Está tudo lá....les uns et les autres...
Jinhos mil

Manuel Veiga disse...

... e no entanto outro destino sonhámos para os "putos" da nossa Pátria.

belo.

beijo

Parapeito disse...

...pois...de que vale tapar o sol com a peneira...
Cada vez mais...o sol quando nasce...é só para alguns...
..."mas as crianças senhor...porque lhes dais tanta dor...porque padecem assim"
Balada das Neves
Um abraço**

partilha de silêncios disse...

Obrigada por chamar a atenção para esta dura realidade.

É cómodo acreditar... que não existem crianças orfãs de afectos e orfãs da própria vida.

um beijo