Antigamente havia sempre aquela música
tu sabes. Era a música feita à beira da seara
o cântico da sede e das ceifeiras. E nosso
era o direito a entrar na casa onde
tínhamos o fresco dos lençóis, o púcaro
de barro de água fresca, o livro de
palavras feitas verso, o gato persa, o ruído
que provoca o silêncio quando excessivo
a um ouvido surdo, uma maçã de
estio cujo sumo escorre sobre o peito
se trincamos a polpa e entre os dentes
se ilumina um sentido, entre os
dedos um frémito súbito se instala.
Porque a brisa nem sempre é um rumor
às vezes é também parte de um
verso. Antigamente havia sempre a
música do sono que chegava sem pressa e
sem vagar, porque tudo acontecia nessa casa.
Lá dentro havia o corpo à sombra espessa.
Nuno de Figueiredo
tu sabes. Era a música feita à beira da seara
o cântico da sede e das ceifeiras. E nosso
era o direito a entrar na casa onde
tínhamos o fresco dos lençóis, o púcaro
de barro de água fresca, o livro de
palavras feitas verso, o gato persa, o ruído
que provoca o silêncio quando excessivo
a um ouvido surdo, uma maçã de
estio cujo sumo escorre sobre o peito
se trincamos a polpa e entre os dentes
se ilumina um sentido, entre os
dedos um frémito súbito se instala.
Porque a brisa nem sempre é um rumor
às vezes é também parte de um
verso. Antigamente havia sempre a
música do sono que chegava sem pressa e
sem vagar, porque tudo acontecia nessa casa.
Lá dentro havia o corpo à sombra espessa.
Nuno de Figueiredo
In Amargas Cores do Tempo. V. N. Famalicão: Quasi, 2006
7 comentários:
Poeta, gostei de ler aqui Nuno de Figueiredo
sem presa li
li e senti a música
um abraço
lena
Bem lindo. Não conhecia o poeta. Obrigada pela partilha.
Um beijo
Belo poema! Gostei imenso. Beijos.
Li. gostei. Não conhecia.
bom dia!
"Às vezes mal sentimos é uma leve aragem
um rumor indistinto um arrepio às ve-
zes entre as árvores onde escondemos os
passos onde os pássaros reúnem sem aviso
da próxima largada onde o lume é
fumo e a chama cinza próxima e
o calor é frio às vezes é outono e mal
sentimos uma fresta da porta entreaberta
a bater de mansinho e o vaso de cíclames
na soleira adeja como um lenço de véspera
nos olhos encobrindo às vezes mal pouco
e mal se distingue um floco de tristeza
mal suspenso não tem nome nem rasto
nem destino poisa ali entre os olhos fica
retido num verso e se buscamos sua
rima seu labor de palavras só às vezes
na cómoda se encontra entre as
cartas a chave mas já nada nos livra
desses olhares cúmplices nas fotografias."
(Nuno de Figueiredo in "A Única Estação")
Que aqui deixo com um grande abraço ;))
É um prazer passar por aqui e ler esta poesia!...
Bjs
Lena, ñão tenho dúvida de que sentiste a música. Um beijo.
Soledade, Paula, Teresa, obrigada pela vossa visita. Um beijo.
Menina, obrigada pelo poema. Este não conhecia, pois não tenho este livro.É lindo! Um beijo.
A.S., o prazer é todo meu. Obrigada pela visita. Um beijo.
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