28.5.18

Desse tempo




Robert Doisneau
Do tempo. Desse tempo em que as cidades
tinham casas com degraus exteriores
onde a luz e a treva adormeciam sem medos.
Desse tempo em que no campo eram benzidas
as oliveiras para que os relâmpagos
não atingissem o lagar,
nem o pão acabado de cozer,
nem o vinho novo, nem o regaço das mães.
Desse tempo em que as portas e as cancelas
dos pátios estavam permanentemente abertas
aos passos de quem vinha.
Desse tempo em que as cores dos berlindes
brilhavam nos olhos das crianças
que, de rua em rua, escolhiam os amigos
para a troca, para a briga, para a bola.
Desse tempo em que as mulheres
levavam na cabeça os cântaros, ou a fruta,
ou os desejos inconfessados do prazer.
Desse tempo tão diferente, até no modo neutro
como olhamos a vida, espalhamos pela casa
os rostos e os nomes.
Desse tempo.

Graça Pires
In: CONTINUUM: Antologia poética. Pinturas de Luís Liberato e  fotografias de Soledade Centeno. Braga: Poética, 2018, p. 119

57 comentários:

_ Gil António _ disse...

Ainda sou do tempo em que havia tempo para viver dentro do tempo. Hoje, não existe esse tempo com tempo de existir.
.
* Beijo-te no silêncio do imaginário *
.
Votos de um dia feliz.

chica disse...

Linda poesia e naquele tempo, tantas diferenças..Hoje as crianças nem nas ruas podem mais estar a brincar! Ótima semana! bjs, chica

As Mulheres 4estacoes disse...

Tempo feliz em que brincávamos sem medo, livres a correr pelas ruas.
Boas recordações...

Ana disse...

Ainda me lembro do tempo em que havia tempo!
Beijinhos,
https://chicana.blogs.sapo.pt/

Cidália Ferreira disse...

Ainda sou do tempo de andar com os cântaros de água à cabeça quase 1 Kilometro e nem só. Belíssimo poema!! Amei!


Especial:- O teu sofrimento causa estranha dor. [Poetizando e Encantando]
.
Beijo e uma excelente semana.

Agostinho disse...

Percebo esse tempo de palavras
escassas e de pausas largas
quando o silêncio trazia
as frases que não se dizia
As sílabas soavam breves
arrastadas num turbilhar
de consoantes amassadas
num tempo em qu o não
era não eo sim era sim
Quando o talvez era o sol
ou a chuva que fazia

Esta poesia faz-se tão presente como se corresse na penumbra como filme na sala de dentro. Excelente.
Bj.

teresa dias disse...

Graça, que beleza de poema!
Cada um dos versos trouxe-me memórias encantadoras.
Vou reler para voltar ao tempo em que a vida se vivia sem medos.
Beijo, amiga.

Marta Vinhais disse...

As memórias em que se desconhecia o medo...havia apenas confiança...
Lindo...
Obrigada pela visita
Beijos e abraços
Marta

Alfredo Rangel disse...

Desse tempo maravilhoso que teus desejos te fazem lembrar. Desse tempo em que sorrir era tão mais fácil que hoje. Em que a simplicidade contava. Em que um simples olhar era um imenso carinho. Tempo em que adoraria ter te amado...
Parabéns, Graça. Impecável!
Perfeito para quem sonha o verdadeiro amor.

LuísM Castanheira disse...

habitamos o tempo e, com ele, viajamos a vida, na alucinante mudança.
somos aquilo a que, a cada momento, respiramos.

e este poema é uma viagem ao passado, ao que foi e já não é.

agarrar essa imagem e transpô-la ao presente é o que, de cada um de nós faz, enquanto memória e identidade.

um belo poema, minha amiga.
Um beijo, Graça.

Francisco Manuel Carrajola Oliveira disse...

Excelente e belo poema, gostei.
Um abraço e boa semana.

Andarilhar
Dedais de Francisco e Idalisa
O prazer dos livros

Daniela disse...

Um poema muito bom!
=)

Um olhar sobre o "bonsai".

Bjinhos

Luis Eme disse...

Do nosso tempo...

abraço Graça

© Piedade Araújo Sol (Pity) disse...

Graça

desse tempo

que nos fique sempre as memórias e que perdure sempre em nós e neste tempo

belo poema minha amiga

boa semana.

beijinhos

:)

Gracimar Martins disse...

Boa tarde Graça! Um lindo poema que nos leva de volta ao tempo. O tempo passa e tudo muda, mas as recordações permanecem em nossas lembranças.
Abraço.

Mirtes Stolze. disse...

Boa noite Graça
Um lindo poema, felizes era o tempo que existia mais liberdade e menos perigo. Feliz semana minha amiga. Enorme abraço.

Ailime disse...

Boa noite Graça,
Tão belo este poema... e tantas memórias a aflorar aos meus olhos.
Desse tempo também sou e nele vivi os melhores anos da minha ainda curta vida na época.
Um beijinho, minha Amiga, e enorme Poeta.
Desejo-lhe uma boa semana.
Ailime

Ana Freire disse...

Desse tempo, em que o tempo, decorria à velocidade de quem o sabia apreciar, e aproveitar...
Onde tudo era mais sentido e intenso... porque havia tempo para cada momento, ser mais vivido... hoje o tempo... dilui-se... perdemos a capacidade de darmos por ele... pois de tão preenchido... e com tantos estímulos e pressões, à nossa volta, há sempre tanto, que nos passa despercebido...
Um poema lindíssimo, que nos transporta a outros tempos... outras memórias... mas onde quase todos, teremos sido certamente, bem mais felizes...
Mais um trabalho maravilhoso, Graça, que adorei apreciar por aqui!
Beijinho! Boa semana!
Ana

Zilani Célia disse...

OI GRAÇA!
DESSE TEMPO, QUEM O VIVEU SENTE SAUDADES.
UM TEMPO EM QUE HAVIA TEMPO, POIS HOJE EM DIA, PARECE QUE ELE CORRE MAIS RÁPIDO QUE "AQUELE" TEMPO.
QUE BELEZA AMIGA.
ABRÇS
http://zilanicelia.blogspot.com.br/

Majo Dutra disse...

Sim, era realmente um outro tempo, um tempo muito diferente,
apesar do José do Telhado, o tal que não roubava aos pobres...
Gostei e relembrar esse tempo num poema belíssimo...
Beijos, estimada Amiga.
~~~

Toninho disse...

Desse tempo que havia pouca luz e mais estrelas no Céu Graça.
Desse tempo de olhar mais nos olhos e tocar mais nas mãos.
Desse tempo saudoso que belamente poetizou com toda sua arte e a ilustração é maravilhosa.
Semana feliz amiga.
Beijo
Hoje feliz com seus livros em mãos.

Tais Luso de Carvalho disse...

Quando falamos naqueles tempos é sempre com o maior encanto, jamais recordaríamos de tempos que não foram bons. A infância ou adolescência sempre nos trazem lindas recordações, foi uma época especial, mas hoje nada mais daquilo existe, ficaram nossas memórias guardadas num cantinho próprio.
Hoje, a realidade é mais dura. Avançamos numas coisas, mas retrocedemos noutras.
Lindo poema, amiga, e tão verdadeiro...
Beijo, uma bela semana!

Anónimo disse...

Eu lembro-me desse tempo. Na minha aldeia era assim com fome, miséria, ignorância. Desse tempo não tenho saudades nenhumas.

São disse...

Desse tempo tenho tantas saudades....


Do teu belo poema ficou um sabor agridoce de tempos irrecuperáveis.

GRacinha, abraço estreito, boa semana

Elton S. Neves disse...

Belíssimo texto que nos fala de um Portugal do passado. De um país livre e de gente livre. Será que o Brasil algum dia já foi assim? Será que a ditadura militar de outrora e o falso regime democrático que o Brasil sempre viveu, algum dia permitiu que esta nação verde-amarela respirasse o ar da genuína liberdade, assim como houve um tempo em que a sua pátria-mãe-(Portugal)- o respirou?

Sim, Graça, no final, SÓ O AMOR IMPORTA!!!

https://novoeltondasneves.blogspot.com.br

SILO LÍRICO - Poemas, Contos, Crônicas e outros textos literários. disse...

Ah... esses tempos!... Maravilhoso poema cheio de lembranças e encantos... Com que verve e arte, engendraste a composição perfeita desse poema!... Com que engenho, buscaste da alma o abstrato para materializar em palavras os sentimentos. Parabéns, grande poetisa! Glória a Deus por tamanha beleza e parabéns por tua luz divina! Grande abraço. Laerte.

ManuelFL disse...

A excelente, festiva, foto de Doisneau e o belo exercício poético da Graça complementam-se e iluminam-se.

Como escreveu André Breton, «O que amei um dia, tenha-o ou não guardado, amarei sempre.»


Beijo.

Teresa Durães disse...

Um tempo antigo que experimentei no Minho, terra do meu pai. Onde éramos convidados a comer e beber, onde a confiança era a verdadeira raiz. Ainda joguei ao berlinde. E ao pião. À cabra-cega. Não posso dizer aos meus filhos, eles não sabem como a brisa acariciava o rosto suado das corridas. Liberdade.

Erika Oliveira disse...

Que lindo e emocionante. Tempo, tempo, tempo... Queria que alguns momentos voltassem.

Uma boa semana.

Fá menor disse...

Há sempre um tempo de saudades!

Beijinhos, amiga!

Nal Pontes disse...

Se o tempo voltasse. Muita coisa seria diferente.
texto lindo bom pra reflexão. Abraços e bons dias pra vc

Victor Barão disse...

Posso afirmar que, pelo melhor e pelo pior, eu derivo originalmente "desse tempo" _ já tão distante e à vez tão próximo.
Magnificas, encantadoras, reveladoras, se acaso saudosas palavras acerca "desse tempo".
Parabéns e obrigado pela partilha, adorei tudo, foto incluída.
Excelente resto de semana
Beijo
VB

Minhas Pinturas disse...

Há momentos bons na vida que nos recusamos esquecer...
Amei a foto e muito o poema.
Beijinhos, Léah

Anete disse...

Bons tempos e felizes oportunidades...
Texto BOM!...
Bj

teresa p. disse...

Poema magnífico que nos transporta a um tempo onde tudo era simples, embora mais difícil. Conseguia-se ser feliz com as pequenas coisas que a vida nos oferecia.
Numa expressão de saudade, repito as palavras da poeta:
"Desse tempo tão diferente, até no modo neutro como olhamos a vida, espalhamos pela casa os rostos e os nomes. Desse tempo."
A foto é maravilhosa.
Beijo.

Suzete Brainer disse...

Você é uma Poeta surpreendente, cada vez que a leio,
cresce em mim a admiração da sua bela arte poética
irretocável, numa dimensão da poesia na beleza imagética,
estética perfeita, profundidade e originalidade.

"Do tempo. Desse tempo em que as cidades
tinham casas com degraus exteriores
onde a luz e a treva adormeciam sem medos."

A fotografia é arte pura e bela também...

Um privilégio sempre a leitura aqui, minha querida.
Beijos.

Neide Bosch disse...

Verdade, bons tempos. E recordar esses tempos nos fazem bem.
Lindo poema.
Bjs!!

Lucinalva disse...

Olá Graça
Belo poema. Desfrutei esse tempo com bastante alegria com os meus irmãos. Bjs querida.

tulipa disse...

Desse tempo em que no campo eram benzidas
as oliveiras para que os relâmpagos
não atingissem o lagar,
nem o pão acabado de cozer,
nem o vinho novo, nem o regaço das mães.

Olá Graça
é mesmo verdade?
Pois desconhecia que as oliveiras eram benzidas...

Belíssimo poema.

Por aqui,
tenho 2 posts recentes neste blogue:
http://pensamentosimagens.blogspot.com/

Após o magnífico almoço no restaurante vietnamita,
rumei à "Quinta das Pintoras"
cujo post fiz noutro blogue meu
e depois
fui visitar o PARQUE VITÍCOLA DE LISBOA.

Foi mesmo uma surpresa ver estas "Vinhas" na cidade de Lisboa.
Quando lá cheguei faltavam 10 minutos para começar a visita guiada,
por alguém ligado à Câmara Municipal de Lisboa.

Se quiser acompanhar, visite-me.
Boa semana, Tulipa

Jaime Portela disse...

Esse tempo acabou... para o bem e para o mal...
Excelente poema, parabéns.
Bom fim de semana, amiga Graça.
Beijo.

mz disse...

Também me contam desse tempo,dos cântaros e dos cestos à cabeça.

Os medos seriam outros e no entanto, ainda que existissem, a felicidade também permanecia. Mais tímida, mais recatada.
E depois, os poetas que nunca deixaram de escrever poemas.

E a Graça que surpreende sempre!
Um beijinho.

Manuel Veiga disse...

um tempo mágico a antecipar a safra dos poemas!

muito bonito, Graça.

beijo, minha amiga

(até amanhã, certo?)

Mar Arável disse...

Tudo se move
Quase tudo se conquista
Sempre bom ler-te
Bjs

Olinda Melo disse...


Sim, Graça, é isso mesmo . Neste seu poema descreve de forma magistral esse tempo em que ainda se podia deixar a porta aberta e as crianças podiam brincar na rua. E cada dia que passa parece distanciar-se de nós de forma dramática. Hoje em dia a desconfiança envenena o relacionamento com os nossos semelhantes.

Beijinhos.

Olinda

© Fanny Costa disse...

Saudades da verdadeira infância! Agora impera a tecnologia, as redes sociais em que se tem tanto amigos e as pessoas vivem cada vez mais sós. As nossas crianças não sabem o valor da verdadeira infância, infelizmente... Saudades!
Beijinho, minha querida!
Fanny

Sinval Santos da Silveira disse...

Querida Poetisa, Mestra Graça Pires !
Que felicidade falar do tempo, quando se viveu,
ou se admira esse tempo. Tenho vários pedaços dos
tempos vividos...
Alguns bons, outros nem tanto.
Parabéns, admirável Escritora, com um fraternal
abraço, aqui do Brasil.
Sinval.

manuela barroso disse...

Ah, grande poeta, como me emocionaste!
Não é saudosismo, não. É saudade de tudo o que dava prazer, de tudo o que era realmente novo e nos dava alegria.
Mas não é só "esse tempo", não! É a forma , tão tua, de o saberes transmitir dessa forma tão nua. Simples( parece...). Tão poética!
Abraço!

Existe Sempre Um Lugar disse...

Boa tarde, Desse tempo, que não resistiu ao cimento armado de linhas direitas, Desse tempo, que as crianças deixaram de brincar livremente na rua, Desse tempo, que teve tantas coisas boas e muito mais coisas más, o poema é uma criação maravilhosa.
Feliz fim de semana,
AG

Pedro Luso de Carvalho disse...

Olá, Graça!
Este teu poema diz muito sobre o tempo passado, de um tempo com mais brilho, mais afagos, tempo que exigia a presença física das pessoas num convívio de trocas e de cuidados. Belíssimo poema, querida amiga.
Bom domingo.
Um beijo.
Pedro

Aline Goulart disse...

Belíssimo poema, Graça. Lembrar de um tempo que tudo era mais agradável é uma arte que encaixa perfeitamente com uma bela poesia. Recordar é uma forma de reviver. Estava com saudade de visitar o seu blog.

Uma belíssima semana.
Beijinhos.

Maria Rodrigues disse...

Lembranças de outros tempos que existem agora apenas nas nossas memórias.
Maravilhoso poema
Beijinhos
Maria
Divagar Sobre Tudo um Pouco

Odete Ferreira disse...

Soube desta obra e dos seus belíssimos autores.
Este teu poema sabe a tempo e a uma vida, ainda que não de um agora.
Felizmente há poetas que o sabem eternizar na sua liquidez.
Bjinho

manuela baptista disse...

desse tempo,

para agora se descobrir que os meninos de hoje, não sabem saltar à corda, dar cambalhotas, jogar à barra, ao berlinde

diferente mas eterno e terno esse tempo


um beijo, Graça

Teresa Almeida disse...

Desse tempo vêm festivas melodias que se albergam no regaço e explodem com intensidade e beleza.

Ler-te é esse íntimo prazer.


Beijinho, Graça.

solfirmino disse...

Amiga,ontem mesmo estava escrevendo sobre infância e cada um tem o seu tempo não é mesmo? Certamente minha lembrança não tem a ver com vinho, cântaros e pães quentes... mas havia muitas crianças ao meu redor. Hoje há menos crianças nas ruas e mais em apartamentos, com certeza.
Grande beijo

Parapeito disse...

Que mais se pode dizer doce Graça!
Que é crime , não haver tempo, para ler algo tao belo.
(Um pouco envergonhada por dizer nao tenho tido tempo)
Abraço**

Filomena Fonseca disse...

Olá Graça,
Cada vez mais te admiro. Que sorte tive em me cruzar contigo! Adoro os teus poemas. Este mês foste divulgada na minha cidade. A Fátima pegou na tua obra e pôs a gente a ler-te. Mereces! Também te li com muito prazer.

Desse tempo, é mesmo assim e:Dantes no tempo havia tempo, havia espaço, havia quintais e conversas. A pé se passeavam pessoas e animais. Hoje no espaço predominam ausências de conversas de terraço!!!
Um grande ABRAÇO!