26.8.12

A incidência da luz



Sei que junto a um cais as pedras são cúmplices
de remotas solidões no coração das âncoras.
Os mapas mais primitivos
e as recentes cartas de navegar não assinalam
a incidência da luz sobre as areias.
Talvez o vento tão íntimo das dunas
saiba onde se escondem os vultos
dos marinheiros quando os barcos
começam a afundar-se nos seus olhos.
Talvez os gemidos do remo estilhaçado
nos punhos sejam a adaga sangrenta
 hasteada em cemitérios
onde se escutam os sinos a rebate.
Talvez os aromas das violetas e dos círios
se misturem com a terra quando as anémonas
começam a despontar nos jardins
perfumando as mãos de pétalas e de fenos.

Graça Pires
De A incidência da luz, 2011