29.4.19

A escassez do amor e do pão de cada dia

Dorothea Lange

Desconhecemos as cicatrizes das mãos
que manejaram a mó dos moinhos
e a fadiga das que mondaram a terra,
num ritual repetido infindavelmente.
Nada sabemos das mãos gretadas
pela acidez das resinas e do pó,
pela dureza da enxada e do arado.
Abandonadas há muito tempo,
as alfaias antigas ainda rangem
nas mãos dos que pisam os trilhos
das cabras em lugares desamparados.
São mãos onde se lê a escassez
do amor e do pão de cada dia.

Graça Pires
De Uma vara de medir o sol, 2018, p. 35

55 comentários:

Luis disse...

as mãos têm tanto que se escreva

Cidália Ferreira disse...

Um belo poema,demasiado sensível!!
*
Seria um sonho tornado realidade...
Beijo e uma excelente semana.

chica disse...

Um poema que faz bem refletir...A realidade de tantos e amor e pão não deveriam nunca faltar! beijos, linda semana! chica

teresa dias disse...

GRANDE poema, querida amiga Graça.
Poucas vezes senti tamanha emoção como a que experimentei ao ler os dois últimos versos:
«São mãos onde se lê a escassez
do amor e do pão de cada dia.»
É magnífica a fotografia de Dorothea Lange. Escolha perfeita!
Beijo, bom fim-de-semana.

Francisco Manuel Carrajola Oliveira disse...

Um poema que retrata bem a vida difícil de muita gente.
Um abraço e boa semana.

Andarilhar
Dedais de Francisco e Idalisa
O prazer dos livros

Teresa Durães disse...

Os meus avós foram professores primários numa época muito difícil, num lugar de Portugal muito difícil. A minha avó, todos os dias, arranjava farinha e leite para dar o pequeno-almoço aos miúdos que apareciam descalços e com fome. Turmas de 35 alunos, assim dizia o Sr. Salazar. Se fossem 34, fechava-se a escola.

A minha avó, já nesta contemporaneidade, quando os via a queixarem-se de tudo, dizia-lhes:

- Já não se lembram como era?

Eu sei, obviamente, que o 25 de abril foi importante, apesar de ter deixado aquele comentário. O meu avô foi preso pela DGS. Mas também li acerca do assunto e saber que a revolução se deu porque os oficiais que não foram à guerra queriam ganhar mais, custa. E custa ver que os que apregoam o 25 de abril são os que enchem os bolsos e deixaram o país com uma dívida brutal. Para as gerações seguintes.

Marta Vinhais disse...

O Mundo duro, muitas vezes, escondido, ignorado, mas que existe...
Brilhante...
Obrigada pela visita
Beijos e abraços
Marta

Larissa Santos disse...

Intenso e não verdadeiro... Adorei

Hoje :-Silencia-me nas palavras que te escrevo

Bjos
Votos de uma óptima Segunda - Feira.

María disse...

Qué dura a veces es la vida.

Muy sentidos tus versos.

Un beso enorme.

A Casa Madeira disse...

O mundo tem tanto alimento...
Isso aí é algo que realmente não dá para aceitar.
Boa entrada de mês de Maio.
PAZ E BEM.

Existe Sempre Um Lugar disse...

Boa tarde, mãos gretadas são sinonimo de trabalho duro rural e da pesca principalmente, o belo poema revela sentimentos solidários.
AG

carlos perrotti disse...

Lúcido brilhante poema sobre as mãos anônimas que o progresso e o desenvolvimento e o bem-estar e a prosperidade sempre abandonam a sua sorte.

"São mãos onde se lê a escassez
do amor e do pão de cada dia..."

Impecável conclusão.

Abraço grande amiga!

Agostinho disse...

Uma poesia que dói na epiderme da alma. As mãos, Graça, que guardam vazias tesouros. Que se deixam ler e prever destinos. De uma anatomia que os urbanos não percebem.
Nem a fadiga que inexoravelmente se perpetua de geração em geração por escassez de conhecimento e de pão.
Beijo, cara amiga Graça, poetisa dos humanos sentidos. E emoções.

Pedro Luso de Carvalho disse...

Boa tarde, minha amiga Graça. Gostei deste teu poema, que canta a vida de pessoas que lutam para colocar o pão à mesa, eles que trabalham tanto e pouco têm para viver. A imagem encaixa-se perfeitamente ao teu belo poema.
Uma ótima semana, Graça.
Um beijo.
Pedro

Luis Eme disse...

Felizmente a poesia da Graça também tem memória...

abraço

Lucinalva disse...

Boa tarde
Que tenhamos sempre um olhar de bondade diante das adversidades. Belo poema. Bjs querida.

José Carlos Sant Anna disse...

E por que faltam? Mas o seu canto nunca será em vão, senão era melhor que tudo se acabasse!
Há sempre uma esperança, e mais além uma coragem!
Um beijo, minha amiga Graça! E uma semana feita de sol e de vento!

Ailime disse...

Boa noite Graça,
Um poema muito belo com uma mensagem muito intensa e verdadeira, que nos fala de uma
outra realidade que a sociedade ignora e tantas vezes já esqueceu infelizmente.
A foto é belíssima e retrata bem essa dura realidade.
Um grande beijinho e os meus votos de uma boa semana.
Ailime

Victor Barão disse...

Para quem, como eu, gosta de fotografia, Dorothea Lange é um hino à fotografia, em grande medida, por via da magistral captação fotográfica das realidades, humanas, mais agrestes.
E a meu modesto ver, o não menos magistral poema da estimada amiga Graça, remete-me desde logo para a minha própria infância e juventude, por exemplo para a recordação da minha mãe a amassar manualmente o pão, de madrugada, à luz do candeeiro a petróleo; mas também para os meus avós, tios-vós, etc., com mãos de grossa pelagem, lavradas por profundos sulcos, em parte enegrecidos pelo tempo e pela prática de trabalhar manualmente a terra, em regra de sol-a-sol. Talvez, também, por eu ser filho e neto directo dessa realidade cultural, vivencial e temporal, que em certa e inicial medida cheguei a ter como um dado adquirido, mas também como uma referência de vida que eu sonhava almejar, o facto é que ainda hoje tenho alguns conflitos internos, por exemplo, face à presente era mecânico-digital; além de que eu próprio, um contextual e/ou absoluto privilegiado face aos meus ancestrais, no entanto para além doutras actividades agro-florestais, por exemplo ainda há cinco ou seis anos atrás andava ainda eu laboral/profissionalmente a semear cereal à mão, oito horas por dia, durante cerca de dois meses consecutivos e salva alguma limitativa patologia, em certa medida, desde logo pelo contacto com a mais elementar natureza envolvente e de mim mesmo, até gostava _ enfim, outras realidades!
Abraço de profunda admiração, com votos de excelente semana!
VB

A Paixão da Isa disse...

um bonito poema que da que pensar e a foto ela mesma da tb para imaginar parabens mt bonito bjs feliz semana

Ana Tapadas disse...

Muito belo e profundo. Colado à vida.
Beijo

Ana Tapadas disse...

Sempre tão bem!
( Nunca te disse, mas o título do livro é muito original.)

JUAN FUENTES disse...

Las parejas debian tener aquellos hijos a los que les pueda dar educación

Roselia Bezerra disse...

Boa Noite de paz, querida amiga Graça!
Pessoas sofridas que refletem em seus semblantes o que vivenciaram pela vida afora. Uma tristeza de se ver, mas, ao mesmo tempo, eles vencem pela perseveança e fé. Bonito de se contemplar a garra existente por trás da dor.
Tenha dias felizes!
Bjm carinhoso e fraterno de paz e bem

Thomas disse...

This one is excellent topic. I am very happy for your nice post. always i am waiting this type post. Thanks in advanced. :) :)
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baili disse...

this is really sensitive dear Grace!!!!!!!!!

poem brought tears in my eyes !
life is constant quest for many indeed

they are not privileged to decide whether they must plea for bread or look for love

remarkably done my friend!

Humberto Maranduva disse...

Pela mão do Homem se vai tecendo o abandono dos dias...
Um belo poema carregado de dilacerante realismo entranhado.
Beijos.

Luísa Fernandes disse...

Olá queria amiga Graça!
Poema extremamente belíssimo e deveras bem verdadeiro.
Pessoas sofridas de semblante baixo, abatidas pelo cansaço e suor, de um trabalho árduo
para a família sustentar...mãos de sol a sol mãos doridas pelas alfaias vencidas da garra dum povo que trabalha arduamente. Gostei muitíssimo amiga, excelente inspiração poética. Parabéns sinceros à homenagem do trabalhador.
Beijinho, tenha uma boa noite de paz e tranquilidade.
Luisa

Majo Dutra disse...

Magnífico poema que foca o que a sociedade sempre pretende
ignorar e ocultar.
Como um açoite benfazejo, muito oportuno, revelando a sua
posição segura na comemoração do Dia do Trabalhador...
Injustiças gritantes que a Revolução dos Cravos não resolveu.
Dias bons, estimada Poeta.
Beijinhos
~~~~

Teresa Almeida disse...

"São mãos onde se lê a escassez
do amor e do pão de cada dia."

Como dói a palavra que tão bem define o mundo cruel! Parece que a fadiga se lê no corpo inteiro, mas teu olhar perscruta a dureza das mãos. Realmente, são elas o maior indicador do tipo de vida que se leva.

Um excelente poema a sinalizar o dia do trabalhador.

Beijo, minha amiga Graça.


Toninho disse...

Socialmente um poema forte e maravilhoso querida amiga.
Este olhar, esta imagem ilustrativa é um espetáculo.
Cada palavra sente as dores das mãos, o fogo nos ossos.
O olhar de quem pede pouco e produz muito.
Lindo trabalho amiga.
Hoje eu adentrei à sua seara por lá.
Um bom feriado amiga.
Beijo

Daniel Costa disse...

Graça Pires as enxadas não se calaram há muito tempo, ou pelos menos o tempo suficiente, para se calarem os vestígios. Acontece que eu continuo com os sulcos, dos calos das mãos que se cortavam à faca.
Bom feriado

ManuelFL disse...

Que bela homenagem da Graça ao Dia do Trabalhador.

A foto da Dorothea Lange é perturbante, o poema é magnífico: «mãos onde se lê a escassez
do amor e do pão de cada dia.»


Beijo e Viva o Primeiro de Maio

Manuel Veiga disse...

Graça, querida amiga

um poema de uma lucidez de cristal!
um humaníssimo grito sobre as dores dos nossos dias!

excelente feriado do Dia 1º de Maio

beijo

teresa p. disse...

No dia em que se celebra o dia do trabalhador, este magnífico poema é uma bela homenagem a todos, homens e mulheres, que trabalham duro para ganhar, dignamente, o pão para sustento da família.
A foto é emocionante e traduz a realidade da vida difícil de muitos desses trabalhadores.
"... mãos onde se lê a escassez do amor e do pão de cada dia."
Beijo


Lu Dantas disse...

Uma bonita postagem, Graça.
Boa escolha para esse dia do trabalhador, que, muitas vezes, é injustiçado, não tem seus direitos garantidos, é explorado, não encontra condições dignas de ter o seu pão e viver o amor.

beijos!

https://ludantasmusica.blogspot.com

LuísM Castanheira disse...

Essas mãos calejadas dos meus pais, dos meus avós,
ainda hoje me doem.
Doi-me a alma por me lembrar deles tanta privação.
Mas era com elas que me davam pão e afagavam meu rosto de amor e paixão.
Um grande poema, este, que guardo como se gritasse bem alto, neste 1. De Maio,
que o trabalho mata. (belíssima ilustração, também)
Um bom dia, minha Amiga Graça.

Anete disse...

Forte, realista e gritante... Que haja pão e AMOR para todos...
Foto que expressa demais os versos, Graça...
Beijinho e feliz Maio...

Maria Emilia B. Teixeira disse...

Bonita a letra que descreve a vida dura das mãos que trabalham.Bjs.

Sinval Santos da Silveira disse...

Querida Graça Pires, boa noite !
Fantástico texto poético !
Privativo dos grandes Mestres.
Admirável criação !
Obrigado, muito obrigado por
partilhar.
Um fraternal e emocionado abraço,
aqui do Brasil !
Sinval.

Reflexos Espelhando Espalhando Amig disse...

Graça,
Bom dia.
Lindos versos.
Belo texto e maravilhosa
publicação inteira.
Refletir é essencial.
Bjins
CatiahoAlc.

Jaime Portela disse...

As mãos dizem tudo.
Excelente poema, gostei imenso.
Graça, um bom resto de semana.
Beijo.

Debby disse...

Maravilhoso....
É quando uma imagem nos remete para o âmago de problemáticas tão dolorosas algumas delas regadas a doçura da vitória ainda que regada a espinhos colhidos no tempo.
Perfeito e as mãos !!! .... Ahh as mãos que criam, que destroem.. que escrevem e que apagam.
Maravilhoso teu texto, parabéns.
Agradecendo a visita em meu blog.
Bjs
Debby :)

lanochedemedianoche disse...

Hermosísimo texto, gracias.
Abrazo

São disse...

Um poema excelente, Graça, excelente e com uma foto transbordante de amarga realidade!

Te abraço fortemente , bom final de semana

Ana Freire disse...

Belíssima inspiração, que não poderia estar melhor complementada, pela imagem anexa...
Uma realidade presente... ainda que meio escondida, aqui e além... ainda no nosso país... e ainda que estivesse bem mais enraizada, há umas décadas atrás...
Como sempre, um momento poético excepcional, forte e profundo, Graça! Gostei muito!
Beijinho! Bom fim de semana!
Ana

Emília Pinto disse...

Toda essa amargura retratada aqui neste teu poema, percebia-a tantas vezes na aldeia onde nasci e vivi até à idade adulta, Eram duros os tempos e o trabalho quase escravo deixava as mãos calejadas, sombra no olhar e cicatrizes na alma; muitas eram as bocas a alimentar, poucas as mãos que , de sol a sol , labutavam e cansadas viam a noite chegar, o pão a escassear e o amor, embora presente, sem tempo para se manifestar. E aqui, Graça, aproveitando este teu belo poema, quero lembrar mães que me marcaram quando era criança lá nessa minha aldeia; mulheres fortes que trabalhavam arduamente, sem queixumes, para que os seus filhos tivessem todos os dias pão na mesa e um caldinho quente que os aquecesse nas noites frias. Apesar de calejadas pela labuta as suas mãos estavam sempre prontas a acariciar aqueles que amavam acima de tudo. Nestas mães, incluo a minha que ainda tenho e que muito trabalhou para dar o melhor aos seus filhos e, se me permites, deixo a minha homenagem a todas elas já que Domingo é o dia dedicado às Mães as únicas capazes de amar sem pedirem nada em troca,.Infelizmente, Graça, há muita falta de amor e ainda há lares onde o pão escasseia, ou, simplesmente não existe. Para uma Mãe, faltar pão na mesa , é uma dor muito grande. A ti, querida Amiga, deixo-te um carinhoso abraço de parabéns por seres a grande mãe que és e os votos de que tenhas un dia especial junto dos teus
Emilia

Duarte disse...

Palavras comoventes, das que deixam cicatrizes pelo que expressam e mais ainda se as relacionamos com essa obra prima fotográfica. Quanta inspiração!
Vivi de perto esta actividade que praticava um dos meus tios, conheço-a bem.
Uma excelência.
Abraços de vida

manuela baptista disse...

é o Amor a clamar amparo

porque tão pouco se altera apesar da convulsão dos tempos


um beijo, Graça

Lourdinha Vilela disse...

Um poema dorido,Uma realidade tão nítida e mesmo assim fadada às sombras do egoísmo.As mãos que retratam fisicamente as dores que poucos conseguem ver. Parabéns querida Graça. Sempre perfeita. A foto também tocou meu coração.

Lua Azul disse...

As mãos são o mapa da vida que a pessoa leva...
Quantas vidas trabalhosas e trites revelam certas mãos!
Poema magnífico, Graça!
Beijo!

© Piedade Araújo Sol (Pity) disse...

as mãos guardam estórias de amor e dor
são mapas
são livros
são vida e trabalhos
são carinho
são ternura

este poema é um mapa da sensibilidade da autora
que nos presenteia com poesia de alto calibre

comovida fiquei

gostei muito da imagem escolhida.

beijinhos

:)

Sandra May disse...

Maravilhoso!!!

Jaime A. disse...

Eu só me posso sentir honrado quando quem escreve e descreve deste modo, me deixa palavras tão animadoras e belas.

Este poema tem uma força, uma ressonância (já terei falado dela, penso) que me deixou a pensar, a sentir...

Tenho de continuar a ler-te, também a desfrutar e (quem sabe) a aprender.

Um resto de bom fim de semana.

solfirmino disse...

Eu sabia que me emocionaria hoje vindo aqui. Esse é mais um daqueles poemas que já conheço, mas sempre é como se fosse a primeira vez.
Beijo, amiga.